domingo, 5 de abril de 2009

CINCO

Por Madalena S.

Era sobre a madrugada que o sonho me chegava embrulhado na luz opiácea daquele instante único entre o breu e a claridade.
Afogada em pecado mortal, chamava por ti e por todos os outros que um dia caminharam ao meu lado, errantes e errados, amantes e amados.
Ninguém vinha.
No vazio do hall de entrada, sob o lustre antigo que tem duas lâmpadas fundidas e um pingente partido, interrompia-me, estática, nua e roxa, à espera do apocalipse anunciado pelo negro dos corvos que voavam em círculos acima do mundo.
Como o apocalipse tardava, desatava os nós dos reposteiros, deixava entrar a mansidão do entardecer e sentava-me na otomana de veludo carmesim a tomar chá, com scones e compota de ruibarbo.
Em suspiros, iam aparecendo os fantasmas, sombras de sempre, companheiros a compasso no passo a passo dos dias perpétuos.
Percorríamos o resto do tempo a jogar canasta e a fazer paciências.

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